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Infecções Fúngicas na Odontologia

A cavidade bucal é considerada a porta de entrada para uma grande variedade de microrganismos, os quais podem desenvolver doenças infecciosas.

Dentre essas patologias, as infecções causadas por fungos são bastante comuns e recorrentes na cavidade bucal.

Algumas espécies fazem parte da microbiota local e diante de condições específicas podem vir a manifestarem sua forma patogênica.

Isso faz com que as infecções fúngicas sejam conhecidas como infecções oportunistas, que se manifestam diante de condições de desequilíbrio.

Ou seja, se aproveitam de fatores predisponentes como a debilidade do sistema imunológico do paciente para causarem danos.

Sabe-se ainda que as infecções fúngicas podem se manifestar a qualquer momento na cavidade bucal.

Logo, é fundamental que cirurgiões-dentistas tenham conhecimento sobre a etiologia, as manifestações clínicas, o diagnóstico, o tratamento e a prevenção dessas doenças.

A seguir, confira mais informações sobre as infecções fúngicas mais comuns que acometem a cavidade bucal.

Candidíase

A candidíase, popularmente conhecida como sapinho, é a infecção fúngica mais comum da cavidade bucal. Esta é causada por um fungo saprófita do gênero Candida sp., que inclui oito espécies.

A mais comum é a Candida albicans, a qual faz parte da microbiota bucal na forma de levedura, não patogênica.

Contudo, diante de condições de desequilíbrio, esses microrganismos assumem a forma filamentosa (hifa) patogênica, adquirindo melhores condições para penetrar na mucosa oral.

Vários fatores podem predispor as condições de desequilíbrio, sendo divididos em dois grupos: fatores gerais e fatores locais.

Fatores Gerais

Os fatores gerais estão diretamente relacionados à condição imunológica do indivíduo.

Sendo assim, são considerados mais propensos:

  • Recém-nascidos e idosos, devido à imunidade imatura ou reduzida;
  • Pacientes com câncer;
  • Pacientes com diabetes melito;
  • Pacientes com hipotireoidismo;
  • Pacientes HIV positivos;
  • Indivíduos com outras comorbidades ou até mesmo aqueles que estejam fazendo uso de antibióticos de largo espectro.

Fatores Locais

Já em relação aos fatores locais que acometem diretamente a cavidade bucal, devem ser considerados:

  • Uso de próteses dentárias antigas e/ou com higienização deficiente;
  • Perda de dimensão vertical;
  • Acidez salivar;
  • Xerostomia;
  • Hipossalivação;
  • Entre outros.

Manifestações Clínicas da Candidíase

A candidíase pode apresentar-se de diversas formas clínicas, variando de acordo com o fator predisponente.

A mais conhecida é chamada “pseudomembranosa”, apresentando-se como placas brancas que lembram “leite talhado” as quais podem ser raspadas com uma espátula ou compressa de gaze.

Vulgarmente conhecida como “sapinho”, acomete principalmente mucosa jugal, dorso de língua e palato. Na maioria dos casos é indolor, podendo provocar apenas alteração de paladar ou sensação de queimação.

Outra forma clínica comum é a candidíase “eritematosa”, que se manifesta como manchas avermelhadas associadas a uma forte sensação de ardor, principalmente na língua.

Quando a candidíase eritematosa está associada ao uso de próteses dentárias pode ser chamada de “estomatite protética”, apresentando pontos avermelhados na região palatina.

A “queilite angular” também é uma forma de candidíase, que acomete o ângulo da cavidade bucal, provocando fissuras e áreas eritematosas na região.

É mais comum em pacientes que apresentam perda de dimensão vertical, o que favorece o acúmulo de saliva e microrganismos no local.

A forma clínica “glossite romboide mediana”, apesar de ter sido considerada um distúrbio do desenvolvimento por muito tempo, atualmente é reconhecida como um tipo de candidíase que provoca atrofia das papilas centrais do dorso da língua.

Foto A – Placas esbranquiçadas acometendo região de palato mole e orofaringe de um paciente adulto após tratamento de Covid.

Foto B – Placas amareladas acometendo região de mucosa labial de um paciente pediátrico.

Diagnóstico da Candidíase

O diagnóstico da candidíase geralmente é feito com base nos aspectos clínicos, e pode ser confirmado por meio de exames complementares como a citologia esfoliativa ou biópsia.

Tratamento da Candidíase

O tratamento da candidíase inclui o uso de medicamentos antifúngicos bem como a identificação e eliminação do fator predisponente, seja ele geral ou local.

Há diversos medicamentos antifúngicos que podem ser utilizados. No entanto, vale ressaltar que preferencialmente o tratamento da candidíase bucal deve ser tópico.

No tratamento tópico, os medicamentos mais utilizados são:

  • Nistatina solução oral – uma colher de sopa do medicamento deve ser colocada na boca, bochechado e posteriormente deglutido, de 3 a 4 vezes ao dia.
  • Cetoconazólicos gel – a forma de gel permite que o medicamento seja colocado na região e mantido por mais tempo na boca.

Para o tratamento sistêmico, pode ser utilizado:

  • Fluconazol por via oral, 1 comprimido de 200mg uma única vez. Se necessário, repetir a dose com intervalo mínimo de uma semana.

Como prevenir candidíase na cavidade bucal?

As medidas preventivas para candidíase incluem:

  • Higienização adequada da cavidade bucal e das próteses dentárias;
  • Substituição de próteses antigas com mais de 5 anos de uso;
  • Evitar a utilização de antibióticos de largo espectro sem indicação;
  • Evitar o tabagismo;
  • Limitar a ingestão de alimentos ricos em açúcar e leveduras;
  • Estar atento às condições sistêmicas em geral.

Paracoccidioidomicose

A paracoccidioidomicose, antigamente chamada de Blastomicose Sul Americana, é uma doença sistêmica causada pelo fungo Paracoccidioides brasiliensis, o qual tem como habitat o solo e vegetação rasteira.

Desse modo, os locais de maior incidência são aqueles de alto índice pluviométrico, o que faz com que essa doença seja endêmica na América Latina, com o maior número de casos detectados no Brasil, principalmente nas regiões sul e sudeste.

Geralmente acomete trabalhadores rurais que manipulam o solo ou até mesmo que possuem o hábito de colocar capim ou gravetos na boca.

O fungo presente no solo é inalado e se instala na região dos pulmões. Portanto, a transmissão não depende de vetores ou reservatórios e não ocorre de forma direta, ou seja, de um indivíduo para outro.

O fungo é dimórfico, sendo inalado na forma de esporos e depois de infectar o indivíduo se transforma na forma de levedura, a qual é patogênica.

No entanto, estudos relatam que o hormônio feminino estrogênio dificulta a transformação do fungo para forma patogênica, o que faz com que a doença seja mais comum em mulheres na menopausa e em homens.

Manifestações clínicas

A inalação do fungo leva à infecção mesmo que sem a manifestação ativa da doença, pois esta depende da virulência do microrganismo, da condição hormonal e da condição imunológica do indivíduo.

Primeiramente o fungo provoca uma lesão pulmonar bilateral e simétrica, dando o aspecto radiográfico de “asa de borboleta”.

A manifestação secundária acomete pele e cavidade bucal, apresentando-se como lesões infiltrativas, ulceradas, eritematosas e de aspecto moriforme (semelhante à superfície de uma amora).

Pode envolver gengiva, rebordo alveolar, língua, palato e lábios.

O curso da doença na cavidade bucal é lento, as lesões são indolores e sangrantes ao toque.

Foto A e B – Lesões ulceradas, eritematosas, de aspecto moriforme, assintomáticas, acometendo rebordo alveolar inferior na região anterior e posterior. Paciente do gênero feminino, 62 anos, na menopausa, lavradora rural. Além das lesões bucais, a paciente relatava tosse persistente e lesões na pele da região das pernas.

Fotos A, B e C – Lesões de superfície ulcerada e/ou com crosta acometendo a toda a face. Na orelha direita observa-se lesão ulcerada destrutiva. Na região do dorso notam-se lesões cutâneas de superfície ulcerada e/ou com crosta espalhadas. Paciente, 27 anos, gênero masculino, trabalhador rural. (Fonte: Garcia, N.G., Oliveira, D.T., Pereira, A.A.C., Magalhães, E.M.S., Hanemann, J.A.C. Extensive cutaneous lesions in paracoccidioidomycosis successfully treated with itraconazole and b-glucan. International Journal of Dermatology 2013).

Diagnóstico da Paracoccidioidomicose

O diagnóstico da paracoccidioidomicose não deve ser feito apenas com base nos aspectos clínicos, pois muitas vezes pode ser confundida com o câncer de boca ou vice-versa.

Neste caso, indica-se a realização de exames complementares como citologia esfoliativa ou biópsia.

Tratamento da Paracoccidioidomicose

Se não tratada, a paracoccidioidomicose pode ser fatal. Os medicamentos mais utilizados são os derivados sulfamídicos, trimetropima, anfotericina B e derivados azólicos.

O tratamento é sempre prolongado e não assegura a eliminação total do fungo, que pode ficar inativo por um determinado período.

Diante da identificação de uma lesão bucal, após realizado um exame complementar e estabelecido o diagnóstico, recomenda-se encaminhar o paciente a um médico para que seja feito um tratamento multidisciplinar.

Como prevenir Paracoccidioidomicose

Como forma de prevenção, recomenda-se que trabalhadores rurais utilizem equipamentos de proteção individual como máscaras e luvas, além de evitarem o hábito de colocar capim ou gravetos na boca.

Histoplasmose

A Histoplasmose é causada pelo fungo dimórfico Histoplasma capsulatum, o qual é encontrado na forma de esporos nas fezes de pássaros e morcegos.

Assim como a paracoccidioidomicose, este é transmitido ao homem por meio da inalação dos esporos.

Manifestações clínicas

Na maioria dos casos os indivíduos contaminados não desenvolvem sintomas da doença, pois a sua intensidade depende do estado imunológico do paciente, da quantidade de esporos inalados e da cepa do Histoplasma capsulatum.

Sendo assim a manifestação clínica da doença pode ser classificada como:

  • Assintomática – a infecção é descoberta por acaso, em exames realizados para outros fins;
  • Subaguda – ocorre infecção pulmonar sintomática com baixo número de esporos, sendo os sintomas semelhantes aos de uma gripe comum;
  • Aguda – os sintomas são um pouco mais intensos, apresentando febre, tosse seca e cansaço;
  • Crônica – mais comum em indivíduos com doenças pulmonares preexistentes, como o enfisema pulmonar, dentre outras. Os sintomas são semelhantes aos da tuberculose, sendo tosse, perda de peso, febre, dispneia etc.; os exames radiográficos apresentam infiltração e cavitação nos lobos pulmonares superiores;
  • Disseminada – presença de foco extrapulmonar, apresentando-se como uma forma progressiva da doença. Ocorre com mais frequência em pacientes HIV positivos e/ou imunossuprimidos. As lesões podem acometer baço, glândulas suprarenais, fígado, rins e cavidade bucal.

As manifestações bucais são pouco comuns, mas podem ser a primeira manifestação da doença.

As lesões bucais podem ocorrer na língua, palato e mucosa jugal, sendo menos frequentes na região da gengiva e lábios.

Clinicamente apresentam-se como lesões ulceradas, papulares ou nodulares, granulomatosas ou em placa, sintomáticas e com algumas semanas de evolução.

Fotos A e B – Lesões eritematosas, ulceradas, destrutivas, sintomáticas, com dois meses de duração, acometendo região de rebordo alveolar e palato.  Paciente, 46 anos, gênero masculino, trabalhador rural. (Fonte: De Freitas Filho, S.A. J., Garcia, N.G., de Souza, M.C., Oliveira, D.T. A Case of Oral Histoplasmosis Concomitant with Pulmonary Tuberculosis. Case Reports in Dentistry. 2019).

Diagnóstico da Histoplasmose

O diagnóstico da histoplasmose pode ser feito associando os aspectos clínicos com exames complementares como bióspia, testes sorológicos, dentre outros.

Tratamento da Histoplasmose

O tratamento na forma sistêmica ou disseminada da doença é geralmente feito com anfotericina B por via endovenosa ou com derivados imidazólicos por via oral.

Entre eles está o Itraconazol, que se mostra mais eficaz na maioria dos casos.

Dependendo do grau de imunodeficiência do paciente e da disseminação da doença, há necessidade de internação do paciente.

Diante da identificação de uma lesão bucal, após realizado um exame complementar e estabelecido o diagnóstico, recomenda-se encaminhar o paciente a um médico para que seja feito um tratamento multidisciplinar.

Como prevenir Histoplasmose?

Como forma de prevenção, recomenda-se que trabalhadores rurais utilizem equipamentos de proteção individual como máscaras e luvas.

Importante salientar que, mesmo quando sua manifestação clínica é localizada exclusivamente na cavidade bucal, como ocorre com a candidíase, uma infecção fúngica se não tratada pode evoluir para uma manifestação clínica generalizada, comprometendo o organismo do paciente como um todo.

Nesse sentido, o cirurgião-dentista possui importante papel no diagnóstico precoce da doença, tratamento odontológico adequado e encaminhamento do paciente a um médico especialista.

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·         Manifestações Bucais de Infecções Sexualmente Transmissíveis

·         Lesões fundamentais na mucosa oral

·         Manifestações Bucais de Doenças Gastrointestinais

Referências bibliográficas:

Almeida, O. P. Patologia Oral. ABENO: Odontologia Essencial: parte básica. Artes Médicas, São Paulo, 2016.

Boraks, S. Semiotécnica, Diagnóstico e Tratamento das Doenças da Boca. ABENO: Odontologia Essencial: parte básica. Artes Médicas, São Paulo, 2013.

Garcia, N.G., Oliveira, D.T., Pereira, A.A.C., Magalhães, E.M.S., Hanemann, J.A.C. Extensive cutaneous lesions in paracoccidioidomycosis successfully treated with itraconazole and b-glucan. International Journal of Dermatology 2013.

De Freitas Filho, S.A. J., Garcia, N.G., de Souza, M.C., Oliveira, D.T. A Case of Oral Histoplasmosis Concomitant with Pulmonary Tuberculosis. Case Reports in Dentistry. 2019.

Publicado por
Profª Dra. Natália Galvão Garcia

Cirurgiã-dentista pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), Mestre, Doutora e Pós-Doutora pela Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP), Professora Dra. do curso de Odontologia do Centro Universitário de Lavras (UNILAVRAS – MG). Atua no consultório nas áreas de Diagnóstico Oral, Cirurgia Oral Menor, Pacientes Especiais e Laserterapia. CROMG: 56425

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