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Saúde Bucal

Manifestações Bucais de Doenças Gastrointestinais

Relação entre doenças gastrointestinais e saúde bucal

É notório que um número considerável de doenças sistêmicas pode acometer a cavidade bucal, comprometendo a saúde bucal dos pacientes. Entre elas, estão as doenças gastrointestinais que apresentam alta prevalência mundial e incidência crescente. 

De acordo com a organização Mundial de Gastroenterologia, pelo menos 20% da população global sofre de alguma disfunção no sistema digestório, englobando esôfago, estômago, intestinos ou os órgãos considerados acessórios, como é o caso do pâncreas e do fígado. 

Algumas dessas doenças podem apresentar manifestações bucais, no entanto, apesar de a cavidade bucal estar situada na porção inicial do tubo digestivo, ainda é difícil compreender os reais impactos negativos de doenças gastrointestinais sobre dentes e tecidos moles adjacentes. 

Relação entre doenças gastrointestinais e saúde bucal 

Segundo o Journal of the Canadian Dental Association, esses efeitos na saúde bucal refletem uma deficiência em minerais, vitaminas, entre várias outras substâncias, causada pelo processo de absorção inadequada geralmente provocado pelas doenças gastrointestinais. 

Logo, é papel do cirurgião-dentista, investigar, diagnosticar e tratar eventuais problemas na região, oriundos de doenças gastrointestinais, bem como encaminhar e orientar o paciente a buscar um tratamento com um gastroenterologista. 

Neste artigo vamos abordar as doenças gastrointestinais mais comuns, assim como etiologia e principais manifestações bucais. 

Biossegurança no consultório odontológico

Doença inflamatória intestinal 

As doenças inflamatórias intestinais são distúrbios crônicos que envolvem a inflamação do trato digestivo. Neste caso, englobam a Retocolite Ulcerativa Idiopática (RCUI) e a Doença de Crohn (DC). 

Estudos ainda buscam compreender os mecanismos fisiopatológicos dessas doenças que, até então, não possuem uma causa conhecida. Contudo, sabe-se que a suscetibilidade à patologia ocorre devido a fatores genéticos e estímulo ambientais. 

A seguir, vamos entender um pouco sobre cada uma delas. 

I) Doença de Crohn (DC)  

Doença de Crohn normalmente se manifesta no íleo distal e o cólon, porém pode afetar outras partes do trato gastrointestinal. Dentre os principais sintomas, é comum pacientes se queixarem de dor abdominal, febre, diarreia e perda de peso.  

A terapia medicamentosa inclui tratamento nutricional, uso de corticoides, imunossupressores e antibióticos que, intrinsicamente, podem contribuir com as manifestações orais da doença. Cirurgias também são indicadas em casos mais extremos.   

Pacientes com essa disfunção, além de estarem suscetíveis a deficiências nutricionais, particularmente das vitaminas D e B12, possuem um risco aumentado de desenvolver câncer colorretal, por isso o acompanhamento contínuo é indicado. 

As principais manifestações bucais oriundas da Doença de Crohn são estomatites aftosas recorrentes. 

No entanto, de forma menos frequente, outras manifestações orais mais específicas podem ocorrer. É o caso de: 

  • Úlceras lineares profundas; 
  • mucogengivite; 
  • queilite granunomatosa; 
  • hiperplasia gengival; 
  • edema difuso dos lábios, mucosa jugal e tecidos gengivais. 

II) Colite Ulcerativa (RCUI) 

Colite Ulcerativa, também conhecida como Retocolite, age na mucosa interna do intestino grosso (cólon) e do reto, promovendo inflamações e ulcerações que variam de leve a grave. Pacientes com essa doença costumam ter sintomas como diarreia com presença de sangue, febre e cólicas abdominais. 

O tratamento desta patologia consiste em um controle de dieta, uso de medicamentos anti-inflamatórios, imunossupressores, corticoides e antibióticos. Por outro lado, cirurgias são indicadas em poucos casos.  

Dentre as complicações, pode-se citar um grande risco de câncer de cólon e, de acordo com a gravidade da doença, o desenvolvimento de colite fulminante ou tóxica. 

No que se refere a manifestações bucais, podem ser menos frequentes quando comparadas à doença de Crohn.   

Neste caso, podemos citar como principais manifestações: 

  • Ulcerações aftosas recorrentes; 
  • halitose; 
  • xerostomia; 
  • dores na ATM.  

Também podem ocorrer alterações na língua e casos de pioestomatite vegetante, com menor incidência. Leia matéria completa sobre “Halitose, suas principais causas e tratamentos“.

Doença Celíaca  

Doença Celíaca é uma doença autoimune genética, na qual o glúten – proteína presente em alguns cereais como trigo, cevada e centeio – provoca uma inflamação na parede interna do intestino delgado, causando a atrofia das vilosidades intestinais e, consequentemente, diminuindo a absorção dos nutrientes.  

Os principais sinais e sintomas observados são diarreia, prisão de ventre, perda de peso, anemia, cólica, desconforto abdominal e sensação de estufamento.  

É muito comum ocorrer em indivíduos entre 6 e 24 meses de idade, após introduzirem o glúten na dieta. Contudo, não há uma regra, podendo se manifestar em pessoas de qualquer idade. 

Quando não tratada, a Doença Celíaca pode promover complicações como osteoporose, linfomas, alterações hepáticas, bem como o desenvolvimento de doenças neurológicas e psiquiátricas.  

Na cavidade bucal, as manifestações comumente observadas são: 

  • Ulcerações aftosas recorrentes;
  • língua despapilada; 
  • distúrbios no esmalte dental; 
  • atraso na erupção dentária. 

Doença do refluxo gastroesofágico (DRG) 

Doença do Refluxo Gastroesofágico trata-se de uma ineficiência do esfíncter esofágico inferior, permitindo passagem de conteúdo gástrico até o esôfago. Essa disfunção acomete de 10 a 20% dos adultos, sendo também muito comum em bebês, logo após o nascimento.  

Um dos sintomas mais comuns é a azia, que pode, ou não, ser acompanhada de regurgitação. Também podem ocorrer dores de garganta, tosse e disfagia, nos casos em que o suco gástrico alcança a cavidade bucal.  

O tratamento do paciente é feito com Inibidores da bomba de prótons ou bloqueadores de histamina-2. O controle da dieta também é um fator terapêutico importante, assim como a dilatação das áreas estreitadas e, em alguns casos, intervenção cirúrgica (fundoplicatura).  

Não sendo preparado para receber uma substância tão ácida como o líquido gástrico, a mucosa pode sofrer grandes danos ao longo do tempo, o que permite o desenvolvimento de esofagite, ulcerações, estreitamento do esôfago e até mesmo câncer de esôfago. 

No que diz respeito às manifestações bucais, estudos citam: 

  • Erosão dental; 
  • halitose; 
  • alterações no fluxo salivar e no paladar; 
  • sensação de ardência e acidez da cavidade oral; 
  • eritema do palato duro, mole e úvula.  

Podemos considerar a erosão dental como a mais significativa em pacientes com doença do refluxo gastroesofágico, onde o cirurgião-dentista é o profissional capaz de identificar possíveis casos ainda não diagnosticados. Além disso, após tratada a patologia, poderá empregar tratamento restaurador, dependendo, é claro, do estágio de erosão. 

Síndrome de Gardner 

A síndrome de Gardner, variante da Polipose Adenomatosa Familial, é uma doença hereditária e rara. Intercorre na mucosa intestinal do paciente, principalmente nos cólons, em forma de pólipos adenomatosos com alto risco para transformação maligna.  

Os principais indícios de que o paciente é portador da síndrome, além dos pólipos já mencionados, são o surgimento de osteomas no crânio e mandíbula e lesões cutâneas e subscutâneas variadas.  

Contudo, estudos mostram que novas características podem aparecer, é o caso de anormalidades oftalmológicas e no esqueleto, deficiência hormonal, cistos epidermoides e tumores desmoides ou malignos. 

Relativo às manifestações bucais, os pacientes costumam apresentar anomalias dentárias de forma e número. Leia mais sobre como diagnosticar anomalias dentárias.  

Na cavidade bucal é possível ainda identificar a presença de: 

  • Tumor odontogênico; 
  • hipodontia;
  • dentes supranumerários; 
  • morfologia dentária anormal; 
  • dentes impactados ou inclusos; 
  • e cistos dentígeros. 

Neste caso, devido à alta densidade óssea de pacientes com Síndrome de Gardner, não é possível realizar tratamento ortodôntico. Logo, os procedimentos odontológicos indicados costumam ser extração cirúrgica e reabilitação protética. 

Neoplasias do trato gastrointestinal 

Neoplasias trata-se de tumores malignos que podem ocorrer em qualquer parte do trato gastrointestinal. Denominados tumores gastrointestinais – GISTs, englobam os cânceres de esôfago, estômago, cólon e reto, sendo estes os tipos de cânceres com uma alta taxa de mortalidade no país.  

Há casos clínicos em que as neoplasias malignas se desenvolvam na região oral do paciente, com foco maior na região posterior da mandíbula e muito raramente na maxila e em tecidos moles.  

De antemão, pacientes com metástases podem não apresentar sintomas, já os sintomáticos podem manifestar: 

  • Dor progressiva;
  • edema; 
  • parestesia; 
  • mobilidade dental; 
  • disfagia; 
  • úlceras orais superficiais. 

Em casos de pacientes já diagnosticados e expostos à tratamento oncológico com radioterapia e/ou quimioterapia, é comum a presença de xerostomia.  

Outro aspecto que pode ser observado é o desenvolvimento de mucosite, levando à formação de ulcerações dolorosas capazes de dificultar a nutrição do paciente. Leia mais sobre a importância da saúde bucal em pacientes com câncer

Principais CID’s relacionados às doenças gastrointestinais. 

O uso de CID – Classificação Internacional de Doenças facilita a comunicação entre os profissionais da saúde. Confira na tabela a seguir os principais CID’s de doenças gastrointestinais. 

CID 10 – K50    Doença de Crohn (enterite regional) 
CID 10 – K50.0    Doença de Crohn do intestino delgado 
CID 10 – K50.1    Doença de Crohn do intestino grosso 
CID 10 – K50.8    Outra forma de doença de Crohn 
CID 10 – K50.9    Doença de Crohn de localização não especificada 
CID 10 – K51    Colite ulcerativa 
CID 10 – K51.0    Enterocolite ulcerativa (crônica) 
CID 10 – K51.1    Ileocolite ulcerativa (crônica) 
CID 10 – K51.2    Proctite ulcerativa (crônica) 
CID 10 – K51.3    Retossigmoidite ulcerativa (crônica) 
CID 10 – K51.4    Pseudopolipose do cólon 
CID 10 – K51.5    Proctocolite mucosa 
CID 10 – K51.8    Outras colites ulcerativas 
CID 10 – K51.9    Colite ulcerativa, sem outra especificação 
CID 10 – K90.0    Doença celíaca 
CID 10 – K21    Doença de refluxo gastroesofágico 
CID 10 – K21.0    Doença de refluxo gastroesofágico com esofagite 
CID 10 – K21.9    Doença de refluxo gastroesofágico sem esofagite  
CID 10 – C26    Neoplasia maligna de outros órgãos digestivos e de localizações mal definidas no aparelho digestivo 
CID 10 – C26.0    Neoplasia maligna do trato intestinal, parte não especificada 
CID 10 – C26.1    Neoplasia maligna do baço 
CID 10 – C26.8    Neoplasia maligna do aparelho digestivo com lesão invasiva 
CID 10 – C26.9    Neoplasia maligna de localizações mal definidas dentro do aparelho digestivo 
D12.6 Síndrome de Gardner 

Finalmente, embora a frequência das manifestações bucais seja variável entre as doenças gastrointestinais e, na maioria dos casos, sejam inespecíficas, essas alterações podem preceder a doença subjacente. Portanto, podem facilitar um diagnóstico precoce. 

É de suma importância que os cirurgiões-dentistas conheçam as peculiaridades destes pacientes. Pois, mesmo sendo comum o desaparecimento de grande parte das manifestações bucais perante o tratamento da doença de base, os profissionais precisam estar preparados para tratar eventuais infecções oportunistas e lesões mais graves.  

Além disso, é preciso levar em conta que a terapia medicamentosa utilizada nos tratamentos das doenças gastrointestinais pode ter influência no aparecimento de novas disfunções orais, sendo necessário um acompanhamento contínuo e multidisciplinar do cirurgião-dentista. 

Possui alguma outra dúvida sobre doenças gastrointestinais e suas manifestações orais? Deixe nos comentários. 

Fontes: 

Jajam M, Bozzolo P, Niklander S. Oral manifestations of gastrointestinal disorders. J Clin Exp Dent. 
2017;9(10):e1242-8. 

https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/6312/1/PPG_35159.pdf

https://www.abcd.org.br/blog/artigos/cuidados-evitam-manifestacoes-bucais/

http://blog.saude.mg.gov.br/2017/05/29/curiosidade-voce-sabia-que-as-doencas-gastrointestinais-sao-mais-comuns-do-que-se-imagina/ 

http://bjhbs.hupe.uerj.br/WebRoot/pdf/348_pt.pdf 

https://www.h9j.com.br/pt/pacientes-e-visitantes/doenca-inflamatoria-intestinal

https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-digestivos/dist%C3%BArbios-esof%C3%A1gicos-e-de-degluti%C3%A7%C3%A3o/doen%C3%A7a-do-refluxo-gastroesof%C3%A1gico-drge

https://bvsms.saude.gov.br/29-5-dia-mundial-da-saude-digestiva/

https://eurofarma.com.br/artigos/problemas-gastrointestinais

Repositório Institucional do Centro Universitário UniGuairacá 

Publicado por
Profª Dra. Natália Galvão Garcia

Cirurgiã-dentista pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), Mestre, Doutora e Pós-Doutora pela Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP), Professora Dra. do curso de Odontologia do Centro Universitário de Lavras (UNILAVRAS – MG). Atua no consultório nas áreas de Diagnóstico Oral, Cirurgia Oral Menor, Pacientes Especiais e Laserterapia. CROMG: 56425

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