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Atendimento Odontológico de Pacientes com TEA – Transtorno do Espectro Autista

Atendimento Odontológico em Pacientes com TEA (Transtorno de Espectro Autista)

Você já atendeu pacientes com TEA – Transtorno do Espectro Autista? O paciente com autismo possui diversas particularidades envolvendo questões orais e comportamentais, e o diagnóstico tem sido cada vez mais comum. 

Dessa forma, em função do aumento no número de pessoas diagnosticadas com o transtorno, é fundamental que o cirurgião-dentista e sua equipe estejam preparados para receberem a pessoa com autismo no consultório odontológico, prestando o tratamento adequado, de acordo com a realidade do paciente.

Ao longo da matéria vamos compreender melhor essa condição, abordando sua origem, os aspectos comportamentais e manifestações orais comuns em pacientes com TEA e as melhores formas de conduzir o atendimento destes casos clínicos.

O que é TEA – Transtorno do Espectro Autista (TEA)?

TEA ou Transtorno do Espectro Autista, trata-se de um distúrbio relacionado à déficits na interação e comunicação social, padrões comportamentais restritos e repetitivos e dificuldade de desenvolvimento intelectual de um indivíduo. 

O Transtorno do Espectro Autista, engloba não apenas o autismo, como também a Síndrome de Aspenger, uma condição com especificações próprias e maior foco na dificuldade de aprendizado. Além disso, fazem parte do TEA demais transtornos de desenvolvimento não especificados. 

Assim, o paciente com TEA possui uma série de condições caracterizadas por desafios com habilidades sociais, ações repetitivas, fala e comunicação não-verbal, bem como por forças e diferenças únicas 

De acordo com estimativas da Organização das Nações Unidas, 1% dos brasileiros possuem TEA. Sua etiologia ainda não é conhecida, contudo muitos autores associam o desenvolvimento do distúrbio à fatores genéticos e neurobiológicos.  

Atualmente, o número de pessoas diagnosticadas com o transtorno vem crescendo, situação que pode ser explicada devido ao maior acesso à informação, levando a população a buscar atendimento especializado para um correto diagnóstico.  

Não há exames que identifiquem o autismo em um paciente, sendo assim, o diagnóstico é clínico, realizado por psicólogo ou psiquiatra, por meio de observação do paciente, análise comportamental e relato dos pais e cuidadores.

Características comportamentais do paciente TEA

Existem três características comuns em pacientes no espectro autista: dificuldade de interação social, déficit na comunicação verbal e não verbal e comportamento limitado e repetitivo, as quais podem se manifestar em conjunto ou de forma isolada.  

Sobretudo, o termo “espectro” refere à uma grande variação nos desafios e pontos fortes possuídos por cada pessoa com autismo.

Como exemplos de comportamento de pacientes no espectro autista, pode-se considerar: 

  • bloqueios para criação de vínculo com pessoas que não fazem parte do seu ambiente; 
  • dificuldade de avaliar tom da voz, expressões faciais e linguagem corporal, resultando na não compreensão de emoções comuns, sutilezas, ironias, etc.; 
  • rituais e rotinas repetitivas e limitadas; 
  • hipersensibilidade a sons, luzes, texturas, tipos de contato físico e movimentos; 
  • dificuldade em estabelecer contato visual; 
  • preocupação excessiva e ansiedade; 
  • hiper foco em objetos, tarefas, situações, etc.; 
  • resistência a mudanças na rotina envolvendo questões simples como trajetos, disposição de móveis, etc.; 
  • violência contra pessoas, objetos ou a si próprio, nos casos em que não consegue se expressar e/ou controlar suas emoções; 
  • Dentre outros. 

E ainda, existem diversos “tipos” de autismo, causados por diferentes combinações de influências genéticas e ambientais.

Graus de autismo

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Academia Americana de Psiquiatria (DSM – 5), o grau de autismo pode ser classificado de 1 a 3, de acordo com intensidade das características que o paciente apresenta no que tange as interações sociais, comunicação verbal e não-verbal, e comportamentos e interesses.  

Ou seja, quanto maior o grau, maiores são as dificuldades de desenvolvimento e interação do indivíduo e maior é a necessidade de suporte no dia a dia.

Autismo leve (Grau 1):

Autista se comunica, mas há déficit e desinteresse nas interações sociais, possui certa dificuldade em fazer amigos. Há ainda grande capacidade funcional, mas inflexibilidade em mudanças e vivência de novas experiências.

Autismo moderado (Grau 2):

Autista se comunica com dificuldade, também possui grandes déficit nas interações sociais. Precisa de suporte constantemente, evidência padrões de comportamento restritivos e repetitivos, além de dificuldade em mudanças de foco e/ou ações.

Autismo severo (Grau 3):

Autista quase não se comunica e suas interações sociais são mínimas. Precisa de suporte substancial dos cuidadores, por ser muito dependente. E altamente impactado com mudanças na rotina e demonstra extrema insatisfação quando isso acontece, afetando seu funcionamento.

Características orais do paciente TEA

Acima de tudo, é importante manter uma saúde bucal adequada aos pacientes autistas.

 Esses pacientes não costumam apresentar distúrbios bucais específicos ao transtorno, todavia, inúmeros fatores como hábitos alimentares, dificuldades motoras, déficit na higiene bucal, uso de medicamentos e apresentação tardia no consultório, podem contribuir para alterações no meio bucal, tornando os autistas mais suscetíveis ao desenvolvimento de doenças. 

Segundo a literatura, é possível que pacientes autistas manifestem: 

  • problemas orais de cáries ativas; 
  • gengivite; 
  • doenças periodontais; 
  • bruxismo; 
  • Pressão da língua contra os dentes; 
  • traumas acarretados pelo autismo; 
  • má oclusão; 
  • falta de musculatura facial; 
  • e demais problemas ortodônticos. 

Dessa forma, é necessário um tratamento mais cauteloso por parte do cirurgião-dentista e acompanhamento odontológico frequente, a fim de prevenir a evolução destes distúrbios.

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Atendimento Odontológico a pacientes com TEA

O atendimento do paciente no espectro autista deve ter grande foco em cuidados preventivos e educação em saúde, é individualizado e deve ser adaptado às necessidades do paciente. 

Existem inúmeros aspectos que devem ser considerados ao atender o paciente TEA, questões como o ambiente, a comunicação com o paciente, o manejo e técnicas auxiliares, o tipo de procedimento a ser executado, as características comportamentais do paciente, etc. 

É claro que isso varia de acordo com o caso individual, todavia, o nível de conhecimento do profissional sobre o autismo e as técnicas que devem ser empregadas em cada situação são elementos fundamentais para um atendimento odontológico de qualidade.

Em relação aos termos utilizados para se referir ao paciente, evite usar o termo “portador de autismo”, afinal a deficiência é uma condição própria e permanente do indivíduo. 

Logo, ao falar sobre a condição do seu paciente, o ideal é que sejam utilizados termos como: “autista”, “paciente autista”, “paciente no espectro autista”, “paciente com TEA”.

Ambiente odontológico

O consultório odontológico ideal para atendimento do paciente com TEA precisa ser um ambiente confortável e que transmita tranquilidade. 

Talvez apenas uma sessão não seja suficiente para que o paciente se sinta ambientado, dependendo do caso, é aconselhado dedicar os primeiros atendimentos para realização da anamnese, compreensão do grau de autismo e das necessidades do paciente, comunicação e socialização com o paciente. 

Além disso, conforme já citamos anteriormente, o paciente costuma ser resistente a mudanças, por isso é preciso manter constância em relação à equipe profissional (dentista, asb, tsb), horário das consultas, consultório em que o paciente é atendido, disposição do mobiliário, etc.

Comunicação e vínculo com o paciente

A criação de um vínculo de confiança entre o profissional e o paciente, bem como com a família deste indivíduo é essencial, pois contribui para que o paciente se sinta mais seguro durante os procedimentos. 

Ao mesmo tempo, no caso de pacientes adultos, é importante que o profissional identifique se a comunicação pode ser feita diretamente com o paciente ou se é preciso se dirigir aos pais e/ou cuidadores. 

A posição do equipo também pode auxiliar no conforto e contato visual com o paciente, pois autistas, por exemplo, possuem dificuldade nesta tarefa.

Manejo durante atendimento

O profissional deve observar as características comportamentais do paciente para definir quais técnicas são mais indicadas. 

Pacientes com TEA possuem sensibilidade extrema aos estímulos externos, como barulhos diferentes, sons fortes e comportamentos inesperados, por isso, muitas vezes o tratamento odontológico pode exigir várias consultas de adaptação e, em casos mais graves, pode ser necessário realizar o atendimento sob sedação ou anestesia geral.  

Sendo assim, o cirurgião-dentista precisa criar um plano de tratamento individual e flexível, que permita mudanças de abordagem de acordo com a resposta do paciente ao tratamento.

Técnicas para atendimento

Existem inúmeras técnicas especiais que podem ser utilizadas para alcançar o sucesso nos atendimentos, as básicas abordam controle da voz, uso de recompensas e distrações, entre outras ações, já as avançadas estão relacionadas ao uso de anestesia e estabilização do paciente. 

Dentre elas, podemos citar:

Método TEACCH (Tratamento e educação para crianças autistas e com distúrbios correlacionados à comunicação)

Neste método utiliza-se painéis, agendas e quadros que demonstrem claramente a ordem das ações que vão ser desenvolvidas, ajudando também na independência do indivíduo.  

Em âmbito odontológico, o consultório pode dispor de um espaço físico onde ficarão disponíveis esses materiais de apoio para que o paciente associe as atividades que serão realizadas pelo dentista, auxiliando na comunicação profissional x paciente. 

Método PECS (Sistema de Comunicação por figuras)

O método PECS faz com que a criança, por meio de figuras, reconheça objetos presente no meio odontológico, ambientando-a com instrumentos que serão utilizados pelo dentista durante o procedimento.

Crianças que utilizam desse sistema conseguem se comunicar por meio da fala, se inclusa a atividade em sua rotina.

Método ABA (Análise Aplicada ao Comportamento)

Caracteriza-se em ensinar o paciente através de etapas, ou seja, a cada nova consulta é introduzido um novo ensinamento, como forma de conquistar a confiança do paciente.  

Ao mesmo tempo, são utilizadas recompensas (prêmios) para motivar o paciente na colaboração.

Técnica da modulação

Nesta técnica usa-se uma pessoa como modelo antes de atender o paciente, logo, a criança modelo colabora durante o atendimento e o paciente autista observa o atendimento.  

O intuito do método é mostrar ao paciente de que forma ele deve se comportar na consulta odontológica.

Técnicas de Odontopediatria

Importante reforçar que, no atendimento odontológico em pacientes com TEA, as técnicas citadas anteriormente são utilizadas em conjunto com outras existentes na odontopediatria, como: distração, “falar, mostrar, fazer”, reforço positivo, estabilização protetora, etc. 

Além disso, o profissional precisa estar preparado para este tipo de atendimento, conhecendo alguma técnica de manejo para conduzir da melhor forma e evitar o atendimento sob anestesia geral, que só deve ocorrer em casos extremos. 

Sedação consciente

A sedação consciente é realizada por meio de inalação de oxigênio e óxido nitroso, fazendo com que o paciente se sinta relaxado, mas consciente durante o procedimento.  

O uso de gás só pode ser feito quando há colaboração do paciente, por isso é preciso ter muita atenção ao usar a técnica, devido ao TEA permitir peculiaridades muito individuais de cada paciente.  

Leia mais sobre o uso de sedação consciente om óxido nitroso.

Para pacientes que possuem dificuldade extrema em colaborar no atendimento, uma solução é o uso de anestesia geral em ambiente hospitalar, todavia, tudo dependerá da individualidade do caso clínico.

Educação em saúde bucal

Pacientes com TEA podem manifestar déficits na higiene oral, comprometendo a saúde bucal e deixando-os suscetíveis a desenvolver doenças como cárie e periodontopatias.  

Isso ocorre por diversos motivos, como:  

  • dificuldades motoras, onde o paciente não consegue realizar a escovação de forma correta; 
  • uso de medicamentos controlados que afetam o meio bucal; 
  • dieta criogênica, devido a uma alimentação restritiva (não aceita comer outros alimentos). 

Logo, a etapa de instrução da higiene bucal se torna fundamental no atendimento de um paciente com TEA, envolvendo principalmente os pais/cuidadores, que devem incluir os cuidados de higiene na rotina da criança.  

O profissional também pode lançar mão de métodos já citados neste artigo para ensinar ao paciente sobre a escovação, levando em conta, é claro, sua autonomia em executar tarefas do dia a dia. Também deve explicar a importância de uma dieta saudável e do acompanhamento dos pais e cuidadores nessa etapa de higiene.  

Dependendo dos casos e do grau de autismo, pode-se sugerir o uso de uma escova elétrica, que facilita o processo de escovação e manutenção da saúde bucal.

Com este artigo foi possível compreender a complexidade do Transtorno do Espectro Autista, mostrando a importância do conhecimento clínico dos profissionais ao receberem um paciente com TEA no consultório. 

Mostra-se também a necessidade de um tratamento mais humanizado, com foco na prevenção e educação em higiene bucal, sendo essencial a existência de uma relação profissional x paciente de confiança, bem como a colaboração dos pais e cuidadores em uma rotina que contribua para a saúde bucal do paciente. 

Gostou do conteúdo? Avalie e envie para um colega dentista! 

Quer saber mais sobre o tema? Confira um episódio especial do Podcast Odonto em Pauta da Dental Speed, onde a Professora Dra. Natália Garcia e o estudante de Odontologia Rodolfo Pinho, falam sobre o atendimento de pessoas com deficiência.

Fontes:  

COIMBRA, Bruna Santiago et al. Abordagem odontológica a pacientes com transtorno do espectro autista (TEA): uma Revisão da literatura. Brazilian Journal of Development. Curitiba, v.6, n.12, 2020. ISSN 2525-8761. 

 
QUAIS são os graus de classificação do autismo?. Funcionalitá, [S. l.], p. 1-1, 7 out. 2020. Disponível em: https://www.funcionalita.com.br/quais-sao-os-graus-de-classificacao-do-autismo#:~:text=Conforme%20o%20DSM%20V%2C%20os,precisa%20de%20um%20suporte%20substancial. Acesso em: 24 mar. 2022. 

 
MATOS, Fabiana Santos. Manejo de paciente com Transtorno do Espectro o Autismo (TEA). Orientador: Hanna Patricia Ganim Pereira da Silva. 2020. 13f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Odontologia) – Centro Universitário do Planalto Central Aparecido dos Santos, 2020. 

DA SILVA, M. J. L et al. Pacientes com transtorno do espectro autista: conduta clínica na odontologia. Rev. Uningá., Maringá, v.59, n.S5, p.122-129, jul/set. 2019. 

ATENDIMENTO Odontológico a pacientes com Transtorno do Espectro do Autismo | Colunista. Sanar Saúde, [S. l.], p. 1-1, 30 jul. 2020. Disponível em: https://www.sanarsaude.com/portal/residencias/artigos-noticias/colunista-odontologia-atendimento-odontologico-a-pacientes-com-tea. Acesso em: 23 mar. 2022. 

Publicado por
Dra. Maria Cecília de Azevedo

Cirurgiã-dentista pela Universidade do Vale do Itajaí, residente no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais - USP Bauru.

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