A tuberculose é uma doença infecciosa milenar com números expressivos no Brasil. É uma doença é evitável e curável, e o tratamento tem o benefício adicional de reduzir a transmissão progressiva da infecção.
Em relação à Odontologia, a tuberculose apresenta dois pontos de atenção: o risco de transmissão para o profissional e as manifestações da tuberculose na cavidade oral, que podem ser sinais da patologia.
Neste artigo, vamos abordar os sinais e sintomas da tuberculose, a importância do papel do dentista e quais as medidas preventivas para garantir a biossegurança no consultório odontológico.

Tuberculose e Odontologia
A tuberculose é uma doença infecciosa que tem como agente causal a bactéria Mycobacterium tuberculosis, a qual tem predileção pelos pulmões, mas também pode acometer outros locais como rins, ossos, gânglios, cavidade bucal, meninges, entre outros.
Embora qualquer indivíduo possa contrair e manifestar tuberculose, alguns fatores quando relacionados podem aumentar a predisposição para doença, como por exemplo, desnutrição, infecção por HIV, transtornos relacionados ao uso de álcool, tabagismo e diabetes.
A infecção deve ser distinguida da doença ativa, como a tuberculose primária e secundária.
A tuberculose primária ocorre em pessoas expostas pela primeira vez ao microrganismo e quase sempre envolve pulmões. Nesse estágio forma-se um nódulo no local inicial de envolvimento, onde podem estar presentes microrganismos vivos latentes.
A tuberculose secundária geralmente ocorre em fase mais tardia, a partir da reativação do microrganismo em uma pessoa previamente infectada, causando o comprometimento do sistema de defesa do hospedeiro.
A manifestação primária é usualmente assintomática, com presença ocasional de febre. Já na secundária, o principal sintoma é a tosse por tempo prolongado, geralmente superior a três semanas, que pode vir acompanhada de outros sinais e sintomas, como febre baixa, falta de apetite, perda de peso, sudorese noturna, cansaço, dor no peito e escarro com sangue.
A transmissão ocorre por via aérea a partir da inalação de núcleos secos de partículas contendo bacilos expelidos pela tosse, fala ou espirro do doente com tuberculose ativa.
Quanto maior a intensidade e a frequência da tosse, o tempo de permanência do indivíduo doente com pessoas que moram na mesma casa, que trabalham ou dividem o mesmo ambiente, e quanto menor a ventilação do local, maior a probabilidade de infecção pelo bacilo.
O diagnóstico é feito por meio de avaliação clínica associada a exames complementares como o radiografia de tórax e/ou exames moleculares, como o teste rápido.
O tratamento da tuberculose é medicamentoso, oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da prescrição de antibióticos que devem ser tomados de forma regular e pelo tempo previsto, conforme recomendação médica.
Com aproximadamente 15 dias de tratamento, a transmissão da bactéria do indivíduo doente para outras pessoas é interrompida, evitando novos casos da doença.
Levando em conta que um dos problemas no controle da patologia é o diagnóstico tardio, e que muitos casos apresentam manifestações na cavidade bucal, a equipe de saúde bucal foi integrada ao Programa de Saúde da Família (PSF), para participar de todas as ações desenvolvidas pelo programa, inclusive ações preventivas e educativas que visam o controle da tuberculose.
No entanto, tanto no atendimento particular como no atendimento odontológico pelo SUS, os dentistas geralmente apresentam dificuldades devido ao diagnóstico tardio e características da doença, o que pode comprometer o desenvolvimento de atividades de promoção, manutenção e recuperação da saúde.
O dentista pode contribuir tanto no controle da doença, como na suspeita do diagnóstico, pois a tuberculose pode atingir pessoas de todas as faixas etárias, apresentando evolução lenta e progressiva. Por isso, se o paciente apresentar febre e sintomas de tosse prolongada (acima de 2-3 semanas), deve ser investigado para o possível diagnóstico de tuberculose.
A seguir, vamos descrever as principais manifestações na cavidade oral e o papel do dentista na identificação da patologia e prevenção da transmissão da tuberculose.
Manifestações orais da tuberculose
Mesmo as lesões bucais sendo pouco comuns, ressalta-se a necessidade de que o profissional tenha conhecimento sobre a doença, desenvolvendo habilidades para o estabelecimento de um diagnóstico precoce.
Não se trata de um exame clínico odontológico voltado exclusivamente para tuberculose, entretanto, numa perspectiva de integralidade e como profissional da saúde, o dentista deve conhecer os principais sinais e sintomas da doença.
Nesses casos a conduta indicada é:
- Realizar uma anamnese minuciosa, atentando-se para história médica pregressa e medicamentos de uso contínuo;
- Realizar um exame físico geral, observando o paciente como um todo;
- Ao identificar lesões bucais, utilizar métodos de diagnóstico complementares como biópsia e exames laboratoriais;
- Controlar o risco de infecção cruzada, realizando o tratamento odontológico com os mesmos cuidados gerais de biossegurança e esterilização;
- Dar preferência inicialmente para os procedimentos de urgência e emergência até que o diagnóstico e tratamento sejam realizados. Obs.: Procedimentos eletivos devem ser postergados até que o paciente esteja em tratamento;
- Encaminhar o paciente para tratamento e acompanhamento médico.
As manifestações bucais da tuberculose podem ocorrer devido à implantação do bacilo existente no escarro, resultante da expulsão de bactérias pela tosse, no entanto, são consideradas pouco comuns.
Clinicamente podem se apresentar como úlceras crônicas e indolores, áreas leucoplásicas nodulares, granulares ou firmes.
Na turberculose primária, as lesões bucais acometem gengiva, fundo de vestíbulo e áreas adjacentes, por outro lado, na tuberculose secundária há uma predileção pelas regiões da língua, palato e lábios. Além disso, as lesões bucais na maioria dos casos são acompanhadas por aumento dos linfonodos locais.
A tuberculose também pode apresentar uma manifestação rara da doença, que é a forma faringolaríngea da tuberculose, que geralmente acomete gestantes e pacientes imunodeprimidos.
As principais características clínicas são a odinofagia (dor ao deglutir) e a presença de lesão com aspecto granulomatose na faringe e/ou laringe.
Atendimento odontológico à pacientes com suspeita de tuberculose
A tuberculose é uma doença de interesse odontológico, visto que o ambiente da clínica favorece sua disseminação, principalmente pela proximidade do profissional com o paciente.
Sendo assim, o risco de contaminação biológica torna-se preocupante diante de aspectos importantes, como o diagnóstico tardio e as formas de transmissão.
O ambiente odontológico, pelas suas particularidades, possibilita que o ar seja uma via potencial de transmissão de microrganismos, por meio das gotículas e dos aerossóis provenientes da caneta de alta rotação, seringa tríplice, ultrassom odontológico, profilaxia dental e por jateamento, de tal maneira que podem contaminar diretamente o profissional ao atingirem a pele e a mucosa, por inalação, ou indiretamente, quando contaminam as superfícies.
Desse modo, existe no Brasil uma legislação que permite incluir a tuberculose como doença ocupacional (Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991), devendo ser notificada em formulário específico (Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT) quando ocorre em profissionais da saúde.
Segundo o Ministério da Saúde, para realização dos “Serviços Odontológicos: Prevenção e Controle de Riscos” com redução dos riscos de contaminação, recomenda-se:
- Usar lençol de borracha, sempre que o procedimento permitir;
- Usar sugador odontológico de alta potência;
- Evitar o uso da seringa tríplice na sua forma spray, isto é, evitar acionar o os dois botões ao mesmo tempo;
- Regular a saída de água de refrigeração;
- Higienizar previamente a boca do paciente mediante escovação e/ou bochecho com antisséptico;
- Manter o ambiente ventilado;
- Usar exaustores com filtro;
- Usar máscaras de proteção respiratórias (N95);
- Usar óculos de proteção;
- Evitar contato dos profissionais suscetíveis com pacientes suspeitos.
Pacientes com histórico médico recente de tuberculose devem apresentar relatório médico declarando a ausência de risco de transmissão antes de iniciar o tratamento odontológico.
Além disso, vale ressaltar que o atendimento à pessoa com possibilidade de transmitir a tuberculose deve ocorrer apenas em caráter de urgência, evitando-se ao máximo procedimentos que gerem aerossóis, como profilaxias, restaurações, entre outros.
Caso tenha necessidade de realizar atendimento odontológico durante os primeiros quinze dias de tratamento para a tuberculose, é recomendado realizar procedimentos que minimizem a formação de aerossóis, e se possível, realizar o atendimento no final do dia, para minimizar os riscos de contaminação cruzada.
É importante lembrar que alguns medicamentos indicados para o tratamento da tuberculose, como por exemplo a Rifampicina e a Isoniazida apresentam interação medicamentosa com alguns fármacos prescritos na Odontologia, podendo diminuir ou potencializar a ação dos mesmos, além do risco de hepatotoxicidade.
Dentre os fármacos, podemos citar os anestésicos odontológicos locais, o Paracetamol e o Fluconazol. A prescrição de anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) é permitida, mas deve-se evitar o uso prolongado.
O manejo odontológico de pacientes com histórico ou suspeita de tuberculose requer uma abordagem multidisciplinar, incluindo a atuação do dentista na identificação de sintomas orais e sistêmicos.
O atendimento odontológico pode ser realizado, sendo fundamental o diálogo com o médico e demais profissionais de saúde que atendem o paciente e sempre seguindo as normas relacionadas à biossegurança na Odontologia, para prevenir a contaminação cruzada.
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Texto escrito pela Profª Dra. Natália Galvão Garcia em 2022 e reescrito pela Dra. Fernanda Skupien em 2024.
Referências:
- Brasil. Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico.2021. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/media/pdf/2021/marco/24/boletim-tuberculose2021_24.03
- Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Serviços Odontológicos: Prevenção e Controle de Riscos. Brasília: Ministério da Saúde. (Série A. Normas e Manuais Técnicos). 2006:156p. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/manuais/manual_odonto.pdf
- Neville BW, Damm DD, Allen CM, Bouquot JE. Oral and MaxilloFacial Pathology. Philadelphia, W. B. Saunders Company; 2016. Brasil. Ministério da Saúde. Plano nacional pelo Fim da tuberculose como Problema de saúde Pública. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/brasil_livre_tuberculose_plano_nac ional.pdf
- WORLD HEALTH ORGANIZATION. Global Tuberculosis Report 2016. Geneva, 2016. Diponível em: http://www.who.int/tb/publications/global_report/en/>.
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- https://aps-repo.bvs.br/aps/quais-as-precaucoes-que-os-profissionais-da-odontologia-devem-adotar-durante-o-atendimento-a-pacientes-com-tuberculose-em-estagio-contagioso/
- https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/ARES/24542/1/Cartilha- Tuberculose_Odonto_Infecciosas.pdf
- http://periodicos.ufc.br/revistademedicinadaufc/article/view/41668#:~:text=A tuberculose é uma doença,como úlceras crônicas e indolores.
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